quarta-feira, junho 02, 2004

 

Resposta ao leitor Renato Santos


Caríssimo,

Em primeiro lugar, obrigado pela visita e por enviar a sua resposta. É sempre bom ouvir as opiniões diferentes, servem de estímulo para novas visões a respeito do assunto.

Continuando, também sou professor e militante do movimento negro. Dou aulas em um pré-vestibular para afrodescendentes, e sou uma mistura do negro com o índio (a avó da minha mãe era índia). Não se sinta desrespeitado, por favor. Não desconheço a discussão, mesmo porque ela faz parte do meu dia-a-dia, e o diálogo com meus interlocutores é constante, você mesmo é prova disso. Peço novamente que não se sinta desrespeitado, mas afirmar que as trajetórias sociais de brancos e negros são distintas é meio redundante. Mas vamos lá...

Não vivo em Marte, e claro que não dá pra deixar de ver o racismo existente em nosso país. Na maior parte das situações que você citou, o negro seria preterido. Já inclusive vivi situações parecidas com as que você descreve. Mas como você deve saber, e ainda que nossas leis sejam difíceis de serem cumpridas, racismo é crime. Inafiançável. Em quaisquer das situações citadas, faça valer a lei. Denuncie. Você faz isso?
Sim, já estudei em escola pública. Escola pública de verdade, não essa "coisa" que temos aí hoje e que chamam de escola pública. E te garanto que as divisões em turmas A, B, C ou D não eram por cor da pele. Eu mesmo estudava nas turmas A.
Veja só, aos poucos você mesmo vai respondendo seus questionamentos, nem precisaria de outro interlocutor. "...Os negros são
realmente inferiores aos brancos, como pregam os racistas?"...
Claro que não são!... por isso mesmo, não precisam de cotas... não somos inferiores, somos iguais. Não queremos favores. Queremos sim, ter as mesmas condições dos outros. As mesmas chances.
Os negros são maioria nas prisões?... os negros também são a maioria da população pobre, não???... Por isso, vejo como solução atacar a pobreza... criar condições melhores para que os pobres (e os negros incluídos) possam ter acesso, ou no mínimo as mesmas chances de acesso que os brancos, uai...
Meu curso de geografia me ensinou, e as matérias de história confirmaram o "projeto de branqueamento"...
Meu curso de Geografia me ensinou também que o país é um dos que mais cresceu nos últimos 150 anos... me ensinou também às custas de que se deu esse crescimento: concentração fundiária e de renda, endividamento externo, abertura a capital estrangeiro, sucateamento de empresas nacionais, uma exclusão social que cresce a cada dia e outras mazelas mais. Digo exclusão social. Não são apenas os negros os excluídos. Todos os pobres são.

Meu curso de Geografia foi excelente, caro Renato...

Finalizando, não tenho tais pretensões intelectuais, mas tenho todo o direito de criticar meus interlocutores sim. Mesmo porque, são parte de mim. Sou parte deles. No pré-vestibular em que trabalho, voltado para afrodescendentes (mas que estudam negros pobres e brancos pobres também), estamos sempre discutindo a situação. Existe quem pense como eu. Muitos outros pensam diferente. São pontos de vista que precisam ser respeitados. Ainda penso que em relação à educação, a melhor política seria aquela que ao menos tentasse minimizar a exclusão... e não que privilegiasse essa ou aquela raça.

As cotas são então uma política para minimizar a exclusão dos negros, ou um reforço à discriminação?... ou uma discriminação às avessas?
Volto a perguntar: você sabe quantos negros concluem o ensino médio?... ou melhor, quantos pobres concluem o ensino médio? Negro não precisa de favor. Nem de esmola. Reforçar o discurso de vítima em nada contribui para a auto-afirmação da raça.

PS: ah, democraticamente, seu email e toda a discussão estão aqui no site, ok?

Abraços!...

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