quarta-feira, julho 14, 2004

 

A hipocrisia da revista "Veja"


A revista "Veja" continua tratando seus leitores como idiotas. Na edição do último final de semana, a revista traz matéria assinada pela jornalista Paula Neiva, intitulada "O barato pode sair caro", tratando sobre os preços dos medicamentos no Brasil. A matéria diz que o preço dos medicamentos no Brasil é um dos mais baratos do mundo, graças à nosso baixo poder aquisitivo e graças ao controle dos preços exercido pelo governo. A partir daí, a jornalista passa a fazer uma crítica a essa situação, começando pela CMED (Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos), órgão do Ministério da Saúde que controla os preços dos medicamentos. A matéria também fala sobre os investimentos da indústria farmacêutica no país, que teriam diminuído em função dos baixos preços e da ameaça de quebra de patentes, comparando o Brasil com a China (país que pratica a quebra de patentes sem maiores constrangimentos). Por fim, a "reportagem" faz uma crítica em relação à tributação dos remédios no Brasil, que chega a cerca de 27% do preço dos remédios.

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Muito estranha a "reportagem". No mínimo estranha. Fico me perguntando quais os interesses que estão por trás da publicação de uma matéria como esta na revista Veja.
Primeiro, desde quando remédios com preços mais baixos são um problema? Podem ser um problema para os fabricantes de remédio, mas com certeza não é problema para os aposentados, doentes, pensionistas, que gastam boa parte do que recebem com medicamentos. Para estes, os preços não são assim tão baixos.
Em segundo lugar, ainda bem que o preço dos remédios é controlado através do CMED, controle este que é feito baseado em uma cotação de preços internacional. Nós sabemos muito bem o que acontece com o preço dos remédios quando tal controle não é exercido. Pra melhorar ainda mais nossa situação, a entrada dos genéricos foi outro fator positivo, com preços até 40% menores que o produto original. Sinceramente, continuo não entendendo onde está o problema, conforme a matéria da Veja.
Terceiro, a reportagem faz menção à ameaça de quebra de patentes que paira sobre os laboratórios, comparando a política brasileira no setor a um país de regime totalitário como a China. Tal afirmação beira o absurdo. Todos somos testemunhas da luta do país pela quebra de patentes para os remédios da AIDS, movido sobretudo por questões humanitárias. A revista Veja talvez não saiba, mas milhões de pessoas morrem no mundo vítimas da doença e dos altos preços dos medicamentos contra a AIDS. Ou a jornalista Paula Neiva não conhece muito bem o país em que mora, ou está fazendo terrorismo, numa tentativa de pressionar a CMED ou o Ministério da Saúde. A pergunta é: quais os interesses que motivaram a jornalista e a revista Veja a fazer comparações tão absurdas? Como comparar os benefícios humanitários com a quebra das patentes dos remédios contra a AIDS com a perda financeira dos laboratórios? Como comparar o Brasil e sua política na área da saúde, com o que acontece na China?
Finalmente, a matéria fala sobre a tributação dos remédios no país. Realmente, quase 30% de impostos embutidos no preço dos remédios é um absurdo, e tal situação deve mesmo ser revista. Mas não para aumentar a margem de lucro dos fabricantes, como quer a reportagem, e sim para fazer com que nossos medicamentos tenham preços ainda mais acessíveis à toda população.

Como podemos perceber, a revista Veja, através da matéria, prestou mais um desserviço para seus leitores. Nada contra publicar matérias que atendam aos interesses da indústria farmacêutica, mas fazer afirmações levianas e desinformar a população, isso a Veja não tem o direito de fazer.

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