quinta-feira, outubro 14, 2004

 

Para entender o capitalismo


Encontrei no endereço do João Mellão, este texto muito interessante, que já postei aqui uma vez:


"Para entender o capitalismo

Como explicar tudo isso de forma sucinta e acessível?

OESP - publicado em maio de 2004

Joãozinho, meu filho, está na faculdade. Um dia desses, um professor falou-lhe maravilhas sobre o comunismo e ele veio me questionar:

__Pai, se o comunismo é tão bom, por que é que o capitalismo venceu em todo o mundo?

Eu poderia indicar-lhe uma centena de livros, mas preferi me propor um desafio: como explicar a um jovem, de forma sucinta e acessível, as inúmeras contradições entre os dois sistemas? Eis, em resumo, o que lhe falei.

__João, o comunismo seria um sistema perfeito se ele não exigisse, como pré-condição, um ser humano perfeito para nele viver. O capitalismo funciona porque ele aceita a natureza humana como ela é e se propõe a aperfeiçoar a sociedade com base no homem já existente.

__Como assim?

__Houve uma época, entre os séculos 19 e 20, em que se acreditava que, se o progresso científico podia revolucionar a natureza física, ele também seria capaz de revolucionar a sociedade e a natureza humana. Daí nasceu a idéia do socialismo e do comunismo. Essa idéia, infelizmente, se mostrou errada. A natureza humana - não importa o progresso material - é imutável. Os homens são, por essência, egoístas, ambiciosos e engenhosos, e a sociedade só pode ser aperfeiçoada se partirmos desses pressupostos.

__É essa a premissa básica do capitalismo?

__É. O capitalismo não é uma ideologia pré-elaborada. Ele nasceu espontaneamente, como conseqüência natural do progresso econômico da Humanidade. Ele não tem criadores, tem, no máximo, interpretadores.

O primeiro deles, foi Adam Smith, um filósofo moral que, na década de 1770, afirmou que todos nós, humanos, temos o desejo inato de melhorar as nossas próprias condições. Segundo Smith "os governos não deveriam reprimir o egoísmo, pois as nações empobreceriam se dependessem unicamente da caridade e do altruísmo".A sua mais famosa constatação foi a de que "não é pela benevolência do açougueiro ou do padeiro que nós contamos com o nosso jantar, mas sim pelo próprio interesse deles em ganhar dinheiro".

Sua conclusão foi a de que "se cada um cuidar de promover os seus próprios interesses, o resultado será a prosperidade da sociedade como um todo".

Por que o padeiro não pede o preço que quiser pelo seu pão? Porque ele enfrenta a concorrência dos outros padeiros e assim tem que cobrar o preço que o mercado impõe. O mercado, segundo ele, é regido por uma "mão invisível" que estabelece todos os preços da economia em função da oferta e da procura existente.

__E o que se conclui disso tudo? Pergunta-me o Joãozinho.

__Que o Estado não deve interferir no mercado ou tentar fixar "preços justos", mas sim deixar que a economia, regida pela "mão invisível" - que nada mais é do que a interação permanente entre todos os indivíduos - caminhe por si só. A ganância inata das pessoas as torna engenhosas e empreendedoras, fazendo-as produzir produtos cada vez melhores por preços cada vez menores. É assim que surgem as novas tecnologias, se dá o progresso, e todos ganham com isso.

__Mas, pai - observa o Joãozinho. Na prática as coisas não se dão bem assim. Tem pessoas que já nascem ricas e poderosas. Como é que os pobres vão competir com elas? E se uma empresa sozinha dominar todo o mercado de um certo produto? Ela não vai impor o preço que quiser e deixar de investir em tecnologia?

__No capitalismo maduro é aí que entra o Estado. Quais são as suas funções? Prover Segurança e Justiça, proibir os monopólios, garantir a livre concorrência e obrigar o respeito à propriedade e aos contratos. Alem disso ele tem um papel importantíssimo que é o de promover iguais oportunidades para todos.

__Como assim?

__Essa é a base moral do capitalismo, meu filho. Cabe ao Estado garantir a "igualdade de oportunidades". O Estado deve prover Educação, Saúde e chances para todos os cidadãos, igualmente, independente de sua origem sócio-econômica. A partir daí, cada qual prospera de acordo com o seu próprio talentos e empenho. Para os menos capazes existe a proteção da seguridade social.

__Mas não é assim no Brasil, não é verdade?.

__Esta é a regra nos países capitalistas avançados. No Brasil, o verdadeiro capitalismo nunca existiu. Por aqui o Estado não garante aos indivíduos condições para que eles ascendam exclusivamente pelo seu próprio mérito e também não há uma eficiente rede de proteção social para proteger aqueles que, por razões diversas, são menos competitivos Além do mais nos falta algo indispensável que o economista Schumpeter definiu como "destruição criadora"...

__O que é isso?.

__O processo de "destruição criadora" é a base do progresso. Ele faz com que, no mercado, as tecnologias obsoletas e as empresas ineficientes sejam implacavelmente desafiadas e substituídas por novas empresas, mais competentes e com tecnologias mais avançadas. Os países comunistas - além de sufocar o ímpeto empreendedor dos indivíduos e impedir a ascensão de novos talentos - não contavam com esse instrumento e , por isso, as suas economias acabaram se estagnando e se inviabilizando. Essa falha, aliás, é também do Brasil. Para que as novas empresas e tecnologias possam florescer é preciso que haja financiamento em abundância. No nosso país, onde o crédito é caro e inacessível, não há o processo de "destruição criadora" e, portanto, há pouco desenvolvimento.

__A meta do comunismo era o da "igualdade total para todos". Qual é a do capitalismo?

__ A bandeira política do capitalismo - ou do liberalismo, que é a sua versão ideológica - não é a da igualdade forçada, mas sim a da liberdade individual e a da prosperidade geral. Qual é a sua meta? Simples:

'Um número cada vem maior de oportunidades para um número cada vez maior de pessoas"

Eu creio que o Joãozinho entendeu..."


Muito bom mesmo o texto. Interessante. Realmente acerta na premissa básica do capitalismo, calcado em sentimentos como ambição e egoísmo, comuns à grande maioria dos mortais. É isso que promove a engenhosidade do sistema e a sua constante reprodução, é a materialização de tais valores em forma de sistema econômico. Não nos moldamos ao sistema, ele que nasceu espontaneamente como resultado de nossas vontades.

Antes eu me importava com o sistema econômico. Sonhava com uma alternativa ao capitalismo, mas fui vendo que a outra opção também não era lá grande coisa. Hoje, não me importa mais qual é o sistema econômico, nem se o capitalismo é mesmo o único horizonte visível em termos de economia. Me preocupo sim com a falta de direitos básicos como saúde, educação, moradia, emprego. Me preocupo com os famintos (e eles existem), com os excluídos, com aqueles abandonados pelo Estado, deixados à própria sorte. Me preocupo com a violência que cresce a cada dia, com a ausência de políticas sociais. Me preocupo com a anomia de nossa sociedade, com o mundo que deixaremos para nossos filhos e netos.

Até tento ser diferente. Tento não me preocupar com nada, mesmo porquê não vai ser eu quem vai consertar o mundo, se é que precisa de conserto. Como estou longe de ser o dono da verdade, vai ver está tudo certo, e eu que me preocupo demais. Mas não consigo ser diferente, não sei o que acontece comigo. Vai ver, sou sensível demais, ou bobo demais. Mas prefiro ser assim, não dá pra fingir que não vejo nada.

E pelo amor de Deus, não venham me dizer pra fazer minha parte, porque eu tento...

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